20 de abril de 2013

Um sonho realizado, uma pessoa mudada - Parte 3

Continuando a brincadeira, então...


Oruro: região de nascimento do atual presidente Boliviano, Evo Morales


    De Cochabamba para Oruro foram cerca de 4 horas de viagem. Então chegamos pouco menos do meio dia, em 5 de fevereiro. Nos deparamos com um ambiente peculiar: 90% das casas sem reboco, numa espécie de tijolo-à-vista-não-forçado e muuuuita poeira! Saímos da rodoviária já com a intenção de encontrar a estação ferroviária, que nos levaria até Uyuni. Paramos para pegar mapa e pedir informações (além de comprar o presente do Rafa, tá Mariel? haha) e notamos que a cidade estava numa atmosfera diferente. O carnaval se iniciaria no dia seguinte! Nem tínhamos ideia que havia Carnaval na Bolívia (e aí os preços mais caros que o normal fizeram sentido), muito menos que o de Oruro era o mais famoso do país e que é até reconhecido pela ONU como patrimônio cultural. As arquibancadas já estavam ficando prontas, as crianças já estavam nas ruas brincando (lá há a tradição de jogar nas outras pessoas balões cheios de água, além de utilizar espuma em lata e arminhas de água. Uma verdadeira "guerra boa") e nós dois ali, alheios a tudo. Tínhamos a ideia de fugir do Carnaval do Brasil e fomos achar um na Bolívia? Ai ai...

Avenida do desfile de Carnaval orureño
Na caminhada até a Ferroviária tivemos o primeiro contato mais forte com a altitude - falta de fôlego em alguns momentos, cansaço mais rápido que o normal e uma dor de cabeça chata e permanente. O tal do soroche existia (nome dado ao "mal da altitude")! Fomos num passo forte até a Estação, com medo de ficarmos sem bilhete, mas chegando lá descobrimos que só abriria as 14:30, uma hora antes de o trem partir. Decidimos então sair para almoçar e comer algo peculiar. Queríamos lhamas! hahaha Embora não tivéssemos encontrado o desejado, entramos num restaurante com ambiente aconchegante, aparentando ser bem cuidado. Pedimos a refeição mais barata, que vinha com sopa, um prato como segundo e o postre (sobremesa). Uma sopa deliciosa de macarrão, um prato de arroz com carne e ovo e uma espécie de suco de amendoim gelado (diferente, mas gostoso) nos saciou e deixou-nos prontos para a nova aventura. Custou 12 bolivianos tudo (4 reais).


Almuerzo

    Como era uma terça-feira, o único trem em atividade era o Expreso del Sur, que tinha um custo mais elevado. Pagamos 56 bolivianos e tínhamos a previsão de chegada as 22:30 em Uyuni. Esse trem era menos confortável que o Trem da Morte, mas muito, muuuuuuuuuuuuuuuuuuuuito mais prazeroso. Desculpe a ênfase, mas é inevitável. Durante o trajeto vimos paisagens fascinantes! É incrível como na Bolívia as paisagens mudam a cada minuto. Vimos montanhas bem vegetadas, montanhas sem vegeteção, montanhas com neve, pastos cheios de lhamas soltas, lagos formados pela chuva, mini-desertos, vilarejos com casas feitas de barro e cobertas com palha, chuva, sol, arco íris, raios, pôr do sol... Resumindo: não há como descrever, juro! Não dá pra dormir durante a viagem, embora o soroche esteja pegando. É de ficar com os olhos fixos na janela, só admirando. Impossível não se emocionar no mínimo uma vez com todo aquele espetáculo da natureza. Por isso digo: não deixes de pegar esse trem e fazer esse percurso se fores à Bolívia. A comida à bordo também é boa, apesar de todos os pratos custarem 35 bolivianos (o que é caro para um início de viagem, e para um mochilleiro).

Umas das várias paisagens incríveis do trajeto Oruro-Uyuni

    Chegamos em Uyuni e agooora sim, o frio. Temperaturas abaixo de 10º C a noite, na altitude de 3600m. Procuramos um hostel ou pousada para nos salvar do vento gelado e nos proporcionar uma boa noite de sono. Encontramos o hostel El Salvador, que já haviam me indicado pela internet antes da viagem. Um lugar simples e confortável, sem grandes regalias, com diárias custando cerca de 25 bolivianos. 


Noite de Uyuni é sempre gelada

Na manhã seguinte, acordamos cedo e fomos em busca de uma agência que nos ofertasse o pacote de 3 dias para o Deserto de Sal de Uyuni (segundo um monumento da cidade, a primeira maravilha do mundo). Uyuni é uma cidade muito pequena, basicamente formada por três quadras e com a Plaza Arce sendo o centro, se é que pode se dizer isso. Em cada esquina há pelo menos uns três vendedores de pacotes para o Deserto. Infelizmente acordamos um pouco tarde e somente haviam vagas nas agências mais caras. Decidimos então ficar mais um dia na cidade, resolver umas pendências (sacar dinheiro, avisar pela internet a todos que estamos bem, lavar roupas, secar outras). Após realizar tais, almoçamos pizza de lhama (finalmente encontramos! Pena que não continha muitos pedaços) e fomos para a pesquisa de preço. Encontramos a agência Full Adventure que nos pareceu organizada e que cobrava 750 bolivianos para o pacote de três dias, incluindo hospedagem, transporte e alimentação durante esse período. Ainda havia 150 bolivianos não-inclusos que teríamos que pagar para entrar na Reserva Nacional de Fauna Andina Eduardo Avaroa. Com os bilhetes em mãos, saímos para conhecer a pequena cidade e seu mini-carnaval, além de comprar frutas, água e doces para a viagem, visto que havíamos sido informados que os mesmos eram escassos nos locais que visitaríamos. 
    Durante a noite, enquanto o Lucas lia e eu arrumava a mochila, aconteceu um apagão - era um convite a nós dois para sair do hostel (depois descobrimos que o fato era de certa forma comum na região) e desbravar a cidade naquela situação inusitada. Pegamos a câmera, nossas lanternas e fomos nos aventurar nessa. Um ambiente meio sombrio, ao estilo jogos de suspense/terror no vídeo game, mas muito divertido. Encontramos uma das várias tendas de senhoras, que estava repleta de barras de chocolate boliviano. De todas as frutas possíveis. Compramos o de manga. Sim, manga. QUE MARAVILHA! O melhor chocolate que comi na minha vida (se um dia você for para lá, compre um para você se certificar que eu não estou mentindo e um para mim, de lembrança, por favor). Podia dormir tranquilo e feliz depois disso.

Cemitério de Trens
   Já na quinta-feira, dia 7, tomamos o desayuno e seguimos à Full Adventure. Conhecemos nosso guia da viagem - Luis Mario- e os clientes companheiros de aventura: o casal equatoriano Daniel e Gabriela, os amigos ingleses Sean e Tobias. Seguimos então para o Cemitério dos Trens, um local onde uma ferrovia foi desativada e sua estrutura permaneceu, à mercê das interpéries. Peculiar e desértico, que proporciona boas fotografias, com os vagões enferrujados e seus trilhos desativados. De lá, partimos para o Salar de Uyuni, um dos principais pontos turísticos bolivianos. Antes passamos no vilarejo onde estão situadas as associações de artesanato, de extração e de refino do sal. Haviam casas construídas com blocos de sal, semelhantes a blocos de gelo utilizados em iglus. Muito interessante!

Construção com blocos de sal no local de seu refino.

Salar de Uyuni
Após minutos de viagem, sai a terra e entra o sal. Sal por todo o lado. Uma imensidão branca, com céu azulzão e flamingos bonitos voando nele. Praticamente impossível não ficar com óculos escuro. O reflexo e a claridade prejudicam muito a visão, embora não haja como deixar de tirá-lo para ver se tudo aquilo é mesmo real. Fizemos o passeio sentados no teto do jipe e apesar da imensidão branca, notava-se vários pontos pretos, com muitos outros jipes de passeio. Todos convergiam para o mesmo local: o famoso hotel de sal. Paramos lá para conhecê-lo, almoçar (carne de lhama, quínua, banana, salada, chocolate e Coca-Cola) e ver suas esculturas de sal, bem como um monumento em frente ao mesmo, em que os visitantes deixam as bandeiras de seus países. O Brasil, claro, estava lá representado pela sua bandeira, pela do Fluminense e pela do MST. Até lá, Jesus! hahaha


Conhecendo o vilarejo
    Maravilhados com aquelas paisagens, retornamos à Uyuni para buscarmos nossas mochilas e partir para a primeira noite do pacote. Não me recordo o nome do local (algo como Illota), mas ao contrário de outra lenda que ficamos sabendo, era confortável, quente e com boa comida, graças à Leonora - esposa do nosso guia e cozinheira oficial da agência. Antes e depois da janta ficamos conversando e jogando cartas com quatro amigas chilenas que faziam o caminho inverso ao nosso: tinham como destino final o Salar. Muito simpáticas, nos contaram sobre o Chile (e me convenceram a conhecê-lo num próximo mochilão) e nos ensinaram jogos de baralho comuns no seu país. Após a jogatina, os chilenos, brasileiros, bolivianos, equatorianos e ingleses foram para seus respectivos dormitórios.
    Na manhã seguinte, acordei muito antes do horário combinado e saí para uma caminhada matinal, um "reconhecimento de campo". QUE LUGAR! Esse vilarejo é formado por três ruas paralelas e poucas perpendiculares a elas, sendo que fica no centro de um vale lindo, formado por uma vegetação rasteira contínua, montanhas rasgando o céu e várias criações de lhamas e carneiros. Quem dera tenha uma vista daquela todas as manhãs. Voltei e todos tomamos café, para então seguir viagem. De lá fomos ao Vale de las Rocas - região com formações rochosas muito bonitas e extensas. Lá sentia-se uma paz de espírito muito confortante e atípica. Ao sentar-me e fechar os olhos, só sentia o barulho e a força do vento, além de algumas aves. Só. Um contato com Deus forte. Daqueles momentos para se guardar para sempre.
Do Vale seguimos para as Lagunas Altiplanas.

Vale de las Rocas

Contarei sobre elas e os dois dias restantes do pacote no próximo post. Tem muita coisa legal ainda para ser falada :)

Um comentário:

  1. Muito interessante teu relato.Parabéns e continua esse trabalho. Adorei conhecer (e vaijei junto) estes lugares através de tua descrição.Um abraço
    Isolda

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