2 de abril de 2013

Um sonho realizado, uma pessoa mudada - Parte 2


Acho que demorei mais pra terminar o relato do que pra fazer a viagem, mas continuando...

Pórtico de entrada na Bolívia, cidade de Puerto Quijarro.

    Passamos a fronteira e entramos na Bolívia, cidade de Puerto Quijarro, no dia 3 de fevereiro. Decidimos não perder tempo, queríamos chegar o quanto antes na Ferroviária e comprar os bilhetes para o famoso Trem da Morte. Mesmo com a pressa, não queríamos gastar dinheiro e achamos melhor ir a pé. Esse modo nos proporcionaria conhecer melhor a cidade e treinar o espanhol, pedindo informações de como chegar ao nosso destino. Nossa ideia de caminhar foi abortada por uma "carona" de um "amigo que fizemos na fila da fronteira. Sim, usei aspas na palavra porque quando estávamos próximos da Ferroviária o nosso ilustríssimo amigo informou que também era um táxi, então os dois tontos (Eu e Lucas) pagaram pelo serviço e desceram.
    Chegamos e descobrimos que naquele dia, um domingo, só sairia um tipo de trem para Santa Cruz de la Sierra - o Super Pullman. Não era o mais barato, mas também não era o mais caro e nos daria um certo conforto, já que era uma viagem de 20 horas. O custo/benefício valia. Horários, itinerários e valores dos trens, seguem nesse link abaixo, tirado do próprio site da empresa:
   http://www.ferroviariaoriental.com/pasajeros/itinerariosytarifas/tabid/59/default.aspx 

Ferroviária para o Trem da Morte
    Assim, trocamos nossos reais pelo boliviano - a moeda local - num câmbio de 1 real para 3 bolivianos (o máximo que conseguimos na viagem foi 1 para 3,15), compramos o bilhete de 127 bolivianos e fomos turistar pelas redondezas, comprar comida e usar o banheiro mais próximo. Dica importante: os banheiros na Bolívia raramente são free. Têm-se que pagar pelo uso, nunca mais que 3 bolivianos. Mas deve-se sempre pedir papel, já que eles não costumam colocar. Nos terminais rodoviários há serviço de banho (chamado de "ducha", custando cerca de 7 bolivianos) e banheiro (chamado de "baño", o que causa uma certa confusão para os brasileiros).
   Durante este tempo de espera na Ferroviária, reencontramos o paulista-japonês que conhecemos na fronteira. Conversamos muito tempo, trocamos bastante informações úteis sobre a Bolívia, descobrimos que ele se chamava Douglas e que faria um roteiro parecido com o nosso, porém ficaria em um vagão diferente do nosso no Trem. Ao entrarmos, nos deparamos com uma realidade totalmente diferente do que lemos em relatos por aí: bancos confortáveis, música ambiente (um clip mais engraçado que o outro na tv, de artistas tradicionais da Bolívia e da Argentina), ar-condicionado, serviço de bordo e nenhum problema. Tudo bem que não fomos no trem mais barato, mas as histórias de pessoas vendendo galinhas e sucos com água suja, sujeitos deitados no meio do corredor, gritaria, balanço contínuo e situações desconfortantes viraram balela. Lá vimos nosso primeiro pôr do sol boliviano e muitas paisagens lindas, jantamos pollo (em todo lugar terá pollo - frango - de todas as formas a venda, prove que vale a pena) com nossos amigos Douglas e Roberto (um equatoriano muuuito gente fina, que vive em Londres e estava fazendo um tour pela América do Sul), descansamos e desmistificamos o Trem da Morte - que pelo que soubemos só é conhecido assim porque antigamente era usado no transporte de doentes dos vilarejos até Santa Cruz e muitos acabavam morrendo no caminho.

Lucas, Bryan e Douglas prontos para o Trem

   Após um bom tempo de viagem, chegávamos próximo das 8 da manhã no Terminal Bimodal de Santa Cruz, onde há lado a lado a Ferroviária e a Rodoviária. Primeira impressão: "porquê esse pessoal está gritando?". Nas rodoviárias bolivianas há muitas viações prestando o mesmo serviço, com valores e horários parecidos. Ou seja, uma grande concorrência. A forma que utilizam para atrair o cliente são vendedores, semelhantes a cambistas, que circulam pelo terminal tentando convencer o cliente de que sua empresa fornece o melhor serviço, com o melhor preço. Nem sempre falando a verdade, já que sabemos que não há muita diferença entre os tipos de ônibus oferecidos e que TODOS os ônibus não tem banheiro, por mais longa que seja a viagem e por mais que eles garantam que tem. Porém, quando o horário de partida de um ônibus se aproxima os mesmos gritam o nome da cidade de destino desse ônibus, para que quem queira ir para o tal lugar vá procurá-los. 

Valores máximos das passagens de ônibus
Nesses momentos a gritaria ecoa no local, já que as empresas fazem horários semelhantes (imagine 20 pessoas gritando num local fechado: ORURO, ORURO, ORUROOOOOOOOOOO! Pois então, é engraçado e agoniante hahaha). Essa também é a hora de pechinchar! Eles reduzem muito o valor nas negociações, tem que ser cara de pau! E há em toda rodoviária um órgão do governo que fiscaliza e tabela os valores máximos a serem cobrados, fique atento a tais.
   Bom, após nos depararmos com esse fato curioso, fomos comprar nossa passagem para Cochabamba, que seria nossa primeira escala até Uyuni. Escolhemos a empresa Expresso Mopar, que vendeu por 40 bolivianos as passagens (as outras vendiam na faixa de 70 bolivianos), com saída as 19:15. Portanto tínhamos 11 horas vagas, que decidimos ocupar conhecendo uma das maiores cidades da Bolívia. Colocamos as mochilas nas costas e fomos procurar alguma pousada/hostel. Queríamos tomar um banho (faziam alguns dias kkk) e deixar nossas coisas, para poder caminhar mais tranquilamente. Com informação dos moradores, conseguimos chegar ao centro da cidade e nos deparamos com algo curioso: há ruas na cidade que possuem somente um tipo de comércio ao longo de toda sua extensão. Imagine uma rua somente com lojas de colchões. Pois é, estranho, mas útil, ao meu ver.
   No centro encontramos um hostel muito legal, com ambiente gostoso, mas muito caro. Conseguimos dele um mapa: nossa salvação (dica: quase toda rodoviária boliviana possui um centro de informações turísticas, que fornecem mapa). Encontramos então o Residencial Ikandire e pagamos 30 bolivianos pelos serviços (um pouco salgado, contudo normal pelo fato de situar-se no centro). De banho tomado, chinelos e roupas confortáveis, fomos procurar algo para comer e lugares interessantes para conhecer. Ao andar por Santa Cruz, passamos por um supermercado e tivemos a ideia de entrar para conhecer o que se vendia de diferente do Brasil. Quanta coisa gostosa (chocolates, picolés, padaria) e quanta coisa curiosa (cuba libre vendida em garrafas semelhantes a de refrigerantes, polvos e lulas em pedaços, frutas diferentes... )! Decidimos comprar nosso almoço ali, conhecer os produtos bolivianos. Almoço do dia: iogurte, alfajores, picolé, sorvete, cerveja local (Paceña, muito boa!) e salteñas (salgado local DIVINO, outra coisa excelente de se provar). Perfeito.

Almoço "Cruceño"
   Depois da refeição legal, saímos para conhecer umas praças locais e os mercados públicos, também para comprar luvas, cachecóis e óculos de sol para o frio de Uyuni. Muito sábio, por sinal, no verão de Santa Cruz, com mais de 30º C, os indivíduos tentarem achar cachecol hahaha foi difícil, mas conseguimos. Após conhecer uma das cidades mais urbanas, menos tradicionais e mais importantes da Bolívia, partimos para Cochabamba. Durante a madrugada, nosso ônibus foi parado pela polícia nacional. Eu e o Lucas não conseguíamos entender nada do que estava acontecendo. Ficamos apreensivos e vimos o motorista e o cobrador desceram para conversar com os policiais. Alguns passageiros foram ajudar na negociação, e nós dois começamos a ligar o fato com o estranho valor baixo dessa viação, em relação às outras. Mas a conversa entre bolivianos funcionou e fomos liberados, podíamos voltar a dormir, mesmo sem entender o que se passou. Chegamos, então, na cidade que menos conhecemos na viagem, porém nela que tivemos a percepção do quão frio seriam os dias seguintes. Sai de campo o calor e umidade semelhantes ao Brasil e entra a altitude, o clima mais seco e as temperaturas reduzidas: hora de colocar os casacos e calças. 
    Chegamos por volta de 6 horas da manhã em Cochabamba e já conseguimos uma passagem as 7 horas para Oruro, por 20 bolivianos pela empresa Coral. Poucas horas de viagem nos separavam da cidade-natal do presidente Evo. Mas, a continuação fica para o próximo post, esse já está ficando extenso. 

Chegando em Cochabamba: altitude e frio dando as boas vindas

A melhor parte da viagem estava por vir :)

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